sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

A CHAVE DE LYON


"Algumas lembranças jamais serão esquecidas". Foi assim que Joana Margot começou as anotações em seu diário, na página datada de 31 de Março de 1570.

- O Sr. gostaria de utilizar a sala reservada que dispomos para os clientes? - a desconhecida voz desviou minha atenção do diário, denunciando que uma mulher permanecia dentro da sala do cofre, repleta de gavetas numeradas em todas as paredes.
- Ah sim, eu gostaria se fosse possível, por favor!
A funcionária vestia um uniforme azul marinho com o emblema do banco. Possuia o cabelo negro preso, e me observava por trás do óculos prateado; em seguida gesticulou para que eu a seguisse. Atravessamos um corredor estreito iluminado e caminhamos até a última porta. Retirou uma chave do bolso destrancando-a, e antes de se retirar avisou-me esboçando um sorriso:
- Fique a vontade Sr. Giorki, poderá utilizar a sala durante o horário de funcionamento da agência.
- Obrigado
- Um funcionário virá avisá-lo quando encerrarmos o expediente. - dizendo isto atravessou o corredor novamente, e subiu as escadas deixando-me sozinho, naquele subsolo cercado de portas de aço e câmeras de segurança.
Encostei a porta e coloquei a gaveta metálica que trazia comigo, sobre a única mesa que ocupava o centro da pequena sala. Naquele espaço secreto não haviam janelas, e nem câmeras de segurança. Uma atmosfera opressora e claustrofóbica começou a invadir-me, enquanto observava aquele ambiente cuja única saída era a porta de aço. Sentei-me e contemplei por alguns segundos a gaveta que tinha a minha frente, recordando a frase que acabara de ler:
"Algumas lembranças jamais serão esquecidas". Trazia na parte da frente, logo acima da fechadura o número 035. Retirei a tampa e reencontrei no interior da gaveta o diário de Joana Margot. Comecei a folhear o caderno observando o canto superior das páginas, até encontrar a folha que continha a data de 31 de Março de 1570. Na linha logo abaixo reli na caligrafia meio apagada pelo tempo, a sentença que aparecia como o título de suas anotações naquele dia, "Algumas lembranças jamais serão esquecidas" e o que seguia:

"Finalmente consegui adentrar nos aposentos de Ivan IV, utilizando-me de subterfúgios que não me vem ao caso especificar agora. Mas gostaria de registar que hoje atravessei certamente o momento mais assutador de minha vida, ficando a mercê deste monstro que governa nossa nação. Em cada segundo em que estive naquele lugar, me assolava o pavor de ser surpreendida pelo retorno de Ivan, o que me custaria a vida. Os instantes em que fiquei dentro do quarto do czar, revelaram-me a opulência da realeza, na riqueza do ouro e nas jóias dos objetos e detalhes presentes naquele espaço. Utilizei cada segundo procurando a antiga chave negra, conforme as recomendações informadas pelo Abade banido . As cortinas de seda cuidadosamente arrumadas, os cristais, as louças e as pedras que brilhavam para onde quer que eu olhasse, desviavam inevitavelmente o foco de minha atenção, enquanto procurava pela pequena chave de Lyon. Tenho na minha lembrança a imagem daquele quarto real, algo que jamais esquecerei. No entanto o temor aumentava com o decorrer do tempo, as vezes permanecia imóvel ao som do menor ruído externo, antecipando nos pensamentos minha sentença de morte. Mas eu a encontrei debaixo da cama, ao descobrir um esconderijo muito bem disfarçado no piso. Neste exato momento tenho a chave de Lyon em minhas mãos, e estou aguardando a chegada do Abade que me revelará o que faremos".

Meu telefone cel
ular tocou, despertando-me do relato de Joana Margot:
- E então? - pronunciou uma voz rápida do outro lado da linha.
- Ainda não descobri Sr.
- Depressa Giorki! eles podem chegar a qualquer momento!
- Estou lendo as anotações de Joana.
- Ela esteve mesmo nos aposentos reais?
- Esteve sim.
- Prossiga, eu volto a ligar.
O silêncio dominou novamente aquele recinto. Coloquei o telefone celular sobre a mesa, tomei o diário de Joana nas mãos virando a página, e continuei lendo-o:

4 de Abril de 1570. - 3 da tarde

"Hoje já não restam mais dúvidas de que fui descoberta, e de que estou prestes a cair nas mãos de Ivan. Tenho esta certeza, pois fui alertada por pessoas de minha estrita confiança, acerca de conversas envolvendo meu nome, travadas nos últimos dias entre Ivan e o conselho Real. Tentarei fugir esta noite de Moscou, mas temo que o meu nome já esteja sendo cogitado e caçado pelos oprichiniks. Ainda tenho por registrar aqui o segredo da chave de Lyon, que me fora revelado pelo Abade enqu!... alguém bate a porta...".

4 de Abril de 1570. - 7 da noite

"Para minha alegria o inesperado visitante era o Abade banido, trazendo-me o plano de fuga que empreenderei ainda esta noite. Cada segundo é valioso. Ele confirmou meus temores de que agora sou uma foragida do czar. Meu pensamentos estão confusos e sinto meu destino perdendo-se, pois desconheço para aonde vou; medida adotada para minha própria segurança segundo as palavras do Abade. Terei que interromper estas linhas, pois uma carruagem me aguarda do lado de fora".

5 de Abril de 1570.

"Depois de viajar durante toda a noite rumando em direção ao norte, o cocheiro me levou a uma propriedade rural, pertencente a uma família de camponeses do círculo de confiança do Abade, onde deverei permanecer escondida. Garantiu-me o bom homem que estarei temporariamente protegida dos temidos cavaleiros negros. Receberam-me com grande hospitalidade e cuidado, pelo qual sou eternamente grata. Realmente não sei o que me teria acontecido se tivesse permanecido em Moscou. A mão de ferro esmagadora de Ivan caiu sobre a população Russa, sujeita aos seus caprichos de lunático. Corre o boato de que o czar elimina pessoalmente, todos os que são considerados seus opositores. Por decisão do Abade e dada a incerteza de sua segurança, ainda manterei a chave de Lyon sob meus cuidados por alguns dias".


8 de Abril de 1570.

"Esta certamente constitui a anotação mais importante que terei feito em vida. Adiei pelo máximo de tempo estas palavras, em virtude do temor de que caiam em mãos erradas, e de que o segredo da chave de Lyon seja utilizado para prejudicar outros, como tinha sido feito até então. Mas felizmente Ivan já não a possui mais, e sinto-me agraciada por ter impedido tal homem de prosseguir com o seu sanguinário intento. Estou em paz comigo por não ter falhado com a organização. Acredito que no futuro a história ocultará esta parte dos fatos, por considerá-los tão inacreditáveis, pois certamente seriam tomados por qualquer indivíduo com sarcasmo e ironia. Mas asseguro que arrisquei minha vida por algo extremamente perigoso e real. Não existem informações precisas sobre a origem da chave de Lyon. Os relatos mais remotos afirmam que o objeto, foi encontrado por um Abade no séc. XIII na fronteira leste da Livônia, e levado por ele até um monastério nas proximidades de Moscou. Assim esta comunidade reclusa passou a estudar a misteriosa chave secretamente. Durante muitos anos o assunto não despertou a atenção, chegando a cair no esquecimento; porém em 1492 uma série de desaparecimentos inexplicáveis de monges agitou toda a comunidade local. As autoridades enviadas não encontraram qualquer pista do paradeiro dos monges, e nenhum corpo que evidenciasse um crime. Interrogando os outros reclusos descobriram um dado estranho e curioso: todos os desaparecidos haviam estudado e manuseado pessoalmente a chave de Lyon. Por uma questão de segurança o objeto foi transferido para o palácio real em Moscou, onde permaneceu até reinado de Ivan, mesmo sob o protesto dos monges que reclamaram o retorno da chave de Lyon para o monastério. Assim que assumiu o poder Ivan ameaçou destruir o monastério, e eliminar qualquer um que tocasse no assunto da chave, mas não conseguiu calar o mentecapto jardineiro, que após os desaparecimentos atravessava os jardins do lugar gritando uma única frase:
- Ele fechou a porta e sumiu!! Ele fechou a porta e sumiu!! Ele fechou a porta e sumiu!! Ele fechou a porta e sumiu!!...- e assim permaneceu o resto de seus dias pronunciando as mesmas palavras, sem imaginar que proclamava involuntariamente a elucidação dos desaparecimentos, até ser morto numa noite pelos cavaleiros negros de Ivan.
Por que Ivan não devolveu a chave ao monastério? Por que ameaçou a todos que tocassem no assunto? Por que os guardas mataram o inofensivo jardineiro? Pensando em tudo isto, não tenho mais dúvidas de que Ivan descobriu algo extraordinário, por trás daquele insignificante objeto; e minhas suspeitas se confirmaram quando conheci o Abade banido, que revelou-me possuir a chave poderes inacreditáveis, capazes de conduzir seu portador de um espaço físico a qualquer outro imaginável, num abrir e fechar de portas. Segundo ele, com a porta fechada, bastava colocar a chave de Lyon na fechadura, imaginar um espaço de tempo preciso que incluísse um determinado dia, lugar e hora, e assim quando a porta se abrisse ao invés de ter diante de si o espaço adjacente que habitualmente encontraria, como por exemplo um corredor, ou outro quarto, estaria o portador da chave diante do local imaginado. Tomada de tamanho assombro, tornei-me a mais cética mulher diante da revelação, mas ao refletir mais cuidadosamente sobre os acontecimentos políticos recentes, envolvendo pessoas importantes cercadas por um rígido aparato de segurança, comecei a considerar possíveis as palavras do Abade banido. Isso explicava os assassinatos de todas as autoridades que ameaçavam o czar. Figuras políticas importantes que residiam em palacios fortificados e possuiam guardas pessoais, amanheciam mortas em seus aposentos com as portas trancadas pelo lado dentro sem nenhuma explicação; soldados bem armados com cães patrulhavam todo o perímetro em vão, e afirmavam categoricamente que durante toda noite ninguém havia atravessado os portões dos palácios. De fato ninguém havia atravessado mesmo! Se a relevação do Abade fosse verdadeira, então Ivan estava utilizando a chave para surpreender seus inimigos, vulneráveis durante a noite em seus aposentos. Bastava ao tirano colocar a chave de Lyon em qualquer porta de seu palácio em Moscou, e abri-la para deparar-se com os aposentos pessoais de seus desafetos. Depois de matá-los recolocava a chave no outro lado da porta e retornava para seus aposentos reais. E foi assim que a organização da qual fazia parte juntamente com o Abade banido, elabourou um plano para roubarmos a chave de Lyon do palácio de Ivan, aproveitando uma cerimônia oficial que aconteceu na noite do dia 31 de Março, quando me infiltrei em seus aposentos disfarçada de serviçal".

18 de Abril de 1570.

"É com imenso pesar que redijo estas linhas, na certeza de que serão as últimas deste diário. Atrevo-me a ocupar este espaço pessoal de minha querida amiga neste momento de luto, por quem devotava as mais profundas e sinceras estimas, para registrar neste papel mais uma vilania deste tirano. Infelizmente o motivo que me leva a fazê-lo é por demais triste, pois minhas tentativas de proteger Joana Margot fracassaram. Soube que na noite de ontém os oprichiniks surpreenderam-na na propriedade na qual se escondia, matando-a bem como a seus protetores, mas não obtiveram sucesso na busca pela chave de Lyon, que já havia sido escondida por Joana. Assim creio que a chave de Lyon bem como seu segredo, estão defitivamente enterrados e longe de homens como Ivan, o que de certa forma me conforta. Lamento profundamente que Joana tenho sida sacrificada para proteger o segredo da chave. Estou desconsolado e sem palav..."


O barulho estridente do telefone celular interrompeu minha leitura, seduzido pelo relato de Joana Margot e do Abade banido, trazendo-me novamente à realidade. Aproximei o telefone do ouvido, e escutei a mesma voz gritando com apreensão:
- Giorki! saia daí agora! Eles chegaram! Saia daí Giorki! Estão entrando na agência. Saia!!

Um grupo de aproximadamente doze homens trajando ternos, e empunhando pistolas automáticas desceu de três veículo que pararam defronte a agência bancária. Em poucos segundos adentraram no prédio a passos rápidos, identificando-se como agentes do serviço de inteligência. Em seguida começaram a interrogar todos os funcionários mostrando-lhes algumas fotos, e questionando se alguém conhecia ou tinha visto o rosto impresso: um misteriosos homem de cabelos loiros, cortados num estilo militar, com a barba feita e de olhar sério. Uma funcionária levantou a mão apontando para as escadas de acesso ao subsolo dizendo:
- Eu conheço este homem, ele se chama Giorki Yelik e está na sala dos cofres.
Os agentes correram em direção as escadas acompanhados por alguns funcionários do banco.

Desliguei o telefone celular e recoloquei o diário na gaveta metálica, enquanto ouvia os passos apressados do agentes sob minha cabeça, no andar de cima do prédio. Retirei um isqueiro do bolso da calça, e o aproximei do caderno de anotações de Joana Margot. Os homens desciam apressadamente as escadas. Apertei o botão e uma pequena chama apareceu alastrando-se por uma folha de papel, aumentando e consumindo as outras folhas vagarosamente. Os passos tornavam-se mais altos, os homens aproximavam-se do corredor que terminava na sala onde me encontrava.
- Sr. Giorki!! Sr. Giorki!! saia agora!! somos do serviço de inteligência! saia com as mãos para cima!- gritava o agente que vinha a frente quase chegando a porta da saleta.
Coloquei a mão no bolso do casaco e retirei uma pequena chave, a tinta negra confundia-se com a ferrugem do metal, denunciando a antiguidade daquela peça. Encaixei-a no buraco da fechadura e depois de poucos segundos abri a porta...

Quando o agente chegou a sala com seus homens, encontrou-a com a porta aberta, e a fumaça começando a espalhar-se pelo corredor. Com um lenço protegendo o nariz, permaneceu parado observando da entrada um pequeno caderno de anotações, que queimava sobre a mesa dentro da gaveta metálica. As chamas consumiam rapidamente o papel, desprendendo alguns pedaços de cinzas incandescentes que flutuavam no ar. A fumaça encheu a sala tornando o ambiente difícil de respirar; até que um funcionário abriu espaço entre os homens, trazendo uma toalha encharcada em água, que lançou sobre a mesa cobrindo toda a superfície. Aos poucos a fumaça começou a se dissipar.
Depois de alguns minutos os agentes entraram na sala para investigar aquele cenário. Quando um dos homens retirou a toalha que cobria a mesa, encontrou apenas um punhado de cinzas negras que desmancharam-se com o movimento do tecido, espalhando-se pelo ar e sujando ainda mais o ambiente. O único resquício ainda legível do diário de Joana Margot, repousava no canto do piso da pequena sala; um folha que havia queimado inicialmente nos encaixes do papel, desprendendo-o do caderno e lançando-o ao chão. Um dos investigadores observou o papel que não trazia nada escrito num dos lados, então apanhou a folha e virando-a encontrou o seguinte texto parcialmente legível:

14 de Abril de 1570.

"Encontro-me confortável e segura nesta casa. Tratam-me com tamanho apreço que sinto-me constrangida diante de meus protetores. Sou visitada regularmente pelo Abade banido, que planeja em breve tirar-me deste lugar. Na visita de ontém disse-me ter conhecido um misterioso aliado que deseja encontrar-me pessoalmente, e que o convenceu de que a minha permanência neste lugar, representa um risco iminente à minha vida. Alegou incansavelmente que devo deixar esta casa dentro de dois dias, e que não estou protegida da guarda pessoal de Ivan, que planeja atacar-nos tendo conhecimento de meu esconderijo. As palavras deste homem que se apresentou como Giorki Yelik impressionaram o Abade, pois tal homem demonstrou ter conhecimento de toda a história da chave de Lyon, bem como de meu paradeiro nos últimos dias, o que me deu a impressão de estar sendo discretamente seguida por este estranho sem perceber. Sendo assim o Abade resolveu dar crédito as palavras do Sr. Giorki, e aguardo ansioamente a sua visita que chegará a qualquer momento, acompanhado por este misterioso homem que deseja enc..."

(Neste ponto termina o relato de Joana Margot interrompido pelas chamas, na única página que restou de seu diário, e que hoje repousa no Museu Nacional de História, na Praça Vermelha em Moscou).

9 comentários:

Poeta Mauro Rocha disse...

Ola!! As mulheres e seus diários, verdadeiros amantes, cúmplices da vida e da morte de suas donas.

Gostei do texto, não conhecia a história.
Tenha uma ótima semana.

dade amorim disse...

Muito interessante, Cris.
Obrigada por sua presença.
Um beijo.

Inaudita disse...

Olá, Cris!

Obtigada pela visita, gostei muito do seu blog também. A propósito, participarei de um congresso em Montreal, no qual apresentarei um trabalho de literatura comparada (sobre textos de blogs). Topdos os textos aqui são seus? Posso citá-los no congresso?

Abraço

Cris disse...

Olá Luana,

Obrigado pela visita. Todos os textos são de minha autoria. Pode citá-los sim no seu trabalho. Desejo boa sorte e sucesso pra você.

Abraço

Cristiana Fonseca disse...

Oi meu amor, amante das descrições detalhadas.
Este texto é o mais diferente digamos assim,entre todos os outros que li.
Muito interessante, no final fui realmente surpreendida.
Beijos meu amor

Cris

Poeta Mauro Rocha disse...

Feliz Páscoa!! Que a renovação seja feita a cada dia que nos é dado!!

Poeta Mauro Rocha disse...

Ola!!
Gostaria mais uma vez agradecer você e a todos que visitam e comentam meu blog, vou parar de publicar por algum tempo e me dedicar a estudos, preciso, já estou de certa forma afastado, visitando pouco meus amigos de blog, mas agora é para valer. Deixo meu “último” poema, dedicado a Brasília e seus 50 anos é antigo, feito quando eu tinha meus 20 e alguma coisa,srsrrs, mas gosto dele e acho que é o momento certo.

Mais uma vez obrigado por suas palavras e carinho com meus poemas e meu blog.

Um abraço!

Poeta Mauro Rocha disse...

Ola!! Minha pausa nos estudos para reler um texto interessante!


Um abraço!!

Poeta Mauro Rocha disse...

Feliz dia das mães e peço emprestado esse poema do nosso poeta maior e faço essa homenagem:


Para Sempre

Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.

Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.

Carlos Drummond de Andrade